O que me faz prosseguir em conhecer

TEMA 1: VISÂO

07/03/2015 01:56

Texto: Lucas 22: 47-62  e  Lucas 24: 13-35

 

Introdução:

            Nossos olhos são as janelas pelas quais tomamos contato com a realidade. Quantas vezes diante de certos acontecimentos ou pessoas, nossos olhos se turvam escurecendo todas as nossas palavras e atitudes dirigidas àquilo e aqueles que estamos vendo. Há experiências acumuladas em nossa mente e coração que esclarecem ou escurecem nossos olhos ante situações que se apresentam diante de nós. Preconceitos, traumas, heranças familiares e tantas outras coisas, agem em nós de forma impressionante, determinando a forma com que olhamos aquilo que nos cerca.

            Nesta mensagem abordaremos dois textos bíblicos: O primeiro será uma troca de olhares entre Jesus e Pedro. Essa troca acontece no momento em que Jesus é preso. Após esse episódio, Pedro vai seguindo Jesus e o olhando de longe. Em seguida, Pedro em uma roda é reconhecido como sendo um dos seguidores de Jesus, mas, seu olhar de medo e de dúvidas faz com que ele negue sua identidade. O terceiro olhar é o de Jesus para Pedro: Um olhar compassivo e meigo, capaz de fazer com que Pedro chore amargamente, mas, se reconheça na condição de um verdadeiro discípulo de Cristo.

            O segundo texto bíblico é o que narra o encontro de Jesus com os discípulos no caminho de Emaús. Nesse episódio, os discípulos estão com os corações cheios de tristeza e preocupações. Isso faz com que o olhar desses discípulos seja reflexo do que o seu coração estava sentindo. Ou seja, todas as vezes que estamos com nosso coração cheio de pesar e tristeza, nossos olhos tendem a olhar apenas aquilo que estamos sentindo. No entanto, quando isso acontece, ficamos “cegos”, incapacitados de enxergar aquilo que de melhor temos, ou seja, a presença do Mestre. Os discípulos estavam tão tristes, que não conseguiram perceber a presença do Mestre que caminhava com eles. 

            Em suma, esses dois textos muito tem a contribuir para a nossa experiência através da visão, que é, como já dissemos,  a janela que nos faz ter contato com a realidade. É preciso ter esse sentido sensível, para enxergar o que de melhor Jesus tem a nos oferecer.

 

I Parte: O Jogo de olhares entre Pedro e Jesus - Lucas 22: 47-62

  1. O Olhar distante

            “Então, prendendo-o, levaram-no para a casa do sumo sacerdote. Pedro os seguia à distancia”. Lucas 22:54.

            Esse olhar distante de Pedro em relação a Jesus só é possível entender a partir da compreensão do que existia entre Pedro e Jesus, ou seja, o relacionamento entre Mestre e discípulo. Embora pareça simples, talvez não sejamos capazes de entender esse relacionamento. Um discípulo nos dias de Jesus era alguém que caminhava junto com o seu mestre, e toda a relação de aprendizado se dava ao longo de uma vida compartilhada, onde discípulo e Mestre conviviam (viviam uns com os outros). Ou seja, quando Pedro seguia Jesus a distancia, isso significava que a relação de discipulado havia sido quebrada.

            Você se lembra de como começou o relacionamento entre Jesus e Pedro?  Certa vez, Pedro estava lançando as redes com seu irmão André. Naquela ocasião, Jesus os avista e faz o seguinte convite: “Sigam-me, e eu os farei pescadores de homens” (Mateus 4: 18-19). Já fazia alguns anos que isso havia acontecido, mas desde então, Pedro e Jesus viviam um relacionamento intenso.

            Imagino que enquanto seguia seu Mestre de longe, Pedro se lembrou da decisão que havia tomado há alguns anos atrás. Uma decisão que não havia sido fácil, pois era uma decisão de entrega. Pedro, assim como os demais discípulos, abriu mão do que era e do que tinha para viver uma relação com o Mestre.  Talvez naquele momento, Pedro estivesse com dúvida da decisão que havia tomado. Logo ele, que quase se afogou após retirar seus olhos do Mestre enquanto caminhava sobre as águas, vê seu coração mergulhado em águas mais profundas do que quando andou sobre o mar.

            Quando nosso relacionamento é quebrado, independente das circunstâncias, podemos experimentar um sentimento de dúvida, pois o que alimenta a nossa Fé é o nosso relacionamento constante com o Mestre. Seguir o Mestre de longe, faz com que o nosso coração se encha de dúvida. Ou seja, nosso relacionamento com o Mestre precisa ser um relacionamento intenso. Não é possível ter um relacionamento intenso seguindo o mestre de longe, é preciso segui-lo de perto. Nessa relação de proximidade não temos tempo para o olhar distante; ao contrário, nos vemos face a face.

  1. Um olhar que denuncia a si próprio.

            “Quando acenderam um fogo no meio do pátio e se sentaram ao redor dele, Pedro sentou-se com eles. Uma criada o viu (...) Olhou fixamente para ele e disse: Este homem estava com ele (...) Pouco depois, um homem o viu e disse: Voce também é um deles”. Lucas 22:55-58.

            Você já teve a impressão de estar sendo acusado por alguém que lança um olhar daqueles que atravessam os esconderijos da alma? Parece que a pessoa que está nos olhando sabe de alguma coisa que só nós sabemos. Na maioria das vezes a pessoa não sabe de nada, mas o nosso olhar nos entrega. Algo parecido com isso foi o que Pedro sentiu naquela noite a beira da fogueira.

            A tentativa de Pedro de se fazer passar por aquilo que ele não era, sentando-se ao redor de uma fogueira para buscar distração e justificação para sua fuga do Mestre e de si mesmo, foi rapidamente frustrada por aqueles que, olhando para ele, o identificaram com o que ele realmente era, mas estava tentando não ser mais. Pedro era discípulo, era um seguidor. Um homem que ao longo das experiências da vida partilhada com Jesus foi sendo iluminado nas sombras de seu coração. Sua tentativa de encontrar uma nova luz na fogueira daquele pátio de fuga foi interrompida pelos olhares devastadores daqueles que diziam: “Este homem estava com ele” (...) “Você também é um deles”.

            Quantas vezes experimentamos situações parecidas com essa que Pedro enfrentou. A covardia e o medo nos leva a tentar ser aquilo que não somos. É como se perdêssemos a nossa identidade. A caminhada cristã não é fácil. Muitas vezes ela exige coragem e ousadia, preços que nem sempre estamos dispostos a pagar. Acredito que Pedro estivesse se sentindo um “peixe fora d’água” em volta daquela fogueira. Exatamente como nos sentimos quando fugimos de nossa essência.

            Um olhar pesado, misturado pelo sentimento de medo e covardia. Pedro se engana ao pensar que conseguiria fugir da sua vida. Seu corpo estava em volta daquela fogueira, mas seu coração não. No mais profundo do seu ser, ele sabia quem ele era. A decisão tomada lá atrás não era uma decisão qualquer, ao contrário, era uma decisão que não tem mais volta. A identidade que assumimos em Cristo não pode ser apagada por um sentimento qualquer.

  1. Um olhar Libertador e cheio de Amor

            “O Senhor voltou-se  e olhou diretamente para Pedro. Então Pedro (...) saindo dali, chorou amargamente”. Lucas 22: 61-62

            Mesmo estando em um momento de angústia, sentindo-se abandonado por seus amigos, Jesus mantém seu coração iluminado, permanecendo capaz de comunicar vida a Pedro com apenas um olhar. O olhar de Jesus revela a integridade do seu coração. Mesmo tendo mudado o olhar de Pedro em relação a ele, Jesus não muda seu olhar em relação a Pedro. O olhar de Jesus conduz o discípulo a um reencontro consigo mesmo e com o Mestre. O choro amargo o retira daquela condição e o traz de volta na situação de discípulo.

            Jesus ainda age desta mesma forma. Mesmo que sejamos covardes, medrosos, indecisos, infiéis, o olhar de Jesus é um olhar de amor, um olhar que nos recoloca no nosso lugar. O olhar de Jesus nos convida ao reencontro. O olhar de Jesus nos reanima. Nesse sentido, o choro vivenciado por Pedro é saudável, pois ele restaura. Quantas vezes precisamos sentir o calor desse choro para que possamos nos encontrar ou até mesmo nos reencontrar com o nosso Mestre.

            O olhar de Jesus é cheio de vida e capaz de vivificar os corações cansados de homens e mulheres que o querem seguir, mas hesitam diante das dificuldades e das fugas que fazemos de nós mesmos e dos olhos do Mestre. Os olhos e olhares de Jesus tiraram o coração de Pedro da morte e da angustia, colocando-o novamente na luminosidade do seguimento do seu Mestre.

            Jesus continua fazendo isso a todo instante ainda nos dias de hoje. Muitos de nós, lá atrás, tomamos a decisão de seguir o Mestre. No entanto, durante a caminhada, não suportamos os obstáculos, as dificuldades e deixamos de caminhar lado a lado para observar o Mestre de longe. Esse distanciamento nos distrai, nos engana, nos coloca em dúvida. Muitas vezes, através desse distanciamento, negamos o Mestre, tal como Pedro. Mas o Mestre sempre nos lança um olhar de amor. Pedro não chora porque o olhar do Mestre tenha sido um olhar de ira; mas chorou porque o olhar amoroso de Jesus toca no fundo da nossa alma. Não existe olhar como o do nosso Mestre. Precisamos encará-lo para desfrutar de uma experiência indescritível. O olhar de Jesus é um olhar de graça. O olhar de Jesus sempre nos alcança!

 

II Parte: Os olhos abertos pelo pão e pela palavra – Lucas 24: 13-35

  1. A desesperança do coração nos incapacita de enxergar a Esperança

            “Enquanto conversavam e discutiam, o próprio Jesus se aproximou e começou a caminhar com eles; mas os olhos deles foram impedidos de reconhecê-lo”. Lucas 24: 15-16.

            Os discípulos no caminho para Emaús caminhavam com o Mestre. Mas os olhos deles foram impedidos de reconhecê-lo. Os olhos dos discípulos foram impedidos pelo que? Certamente o que os impedia de ver com o coração aquele que estavam vendo diante de seus olhos era a desesperança que tomara conta de suas vidas. Essa desesperança crescia à medida que seus pensamentos estavam presos àquilo que  havia acontecido com Jesus antes da ressurreição. Seus olhos estavam postos nas experiências de morte e perseguição que eles testemunharam. “No caminho, conversavam a respeito de tudo o que havia acontecido” (Lucas 24:14).  

            O mesmo acontece conosco: Todas as vezes que pousamos nossos olhos sobre o desespero, não conseguimos ver nada além do desespero. Ou seja, nosso olhar, por muitas vezes será o reflexo daquilo que estamos sentindo. Quantas vezes através do olhar de uma pessoa, percebemos que algo não está indo bem com ela? Quantas vezes, em função do nosso olhar, as pessoas percebem que algo não está bem conosco? No entanto, esses problemas tendem a nos “cegar” nos impossibilitando de ver tantas outras coisas em nossa volta. Por isso a Escritura nos diz para “trazer a memória aquilo que me dá esperança”. Se cultivarmos o hábito de nos voltar continuamente para as experiências fracassadas de nossa vida, nossos olhos serão atrofiados numa espécie de daltonismo, a vida vai perdendo as cores e sabores. Se ao contrário, guardarmos nossos olhos nas esperanças do viver, aí nossos corações serão tomados por um novo horizonte onde vale a pena construir projetos de felicidade. Como diz o sábio escritor de Eclesiastes: “O homem sábio tem olhos que enxergam, mas o tolo anda nas trevas”. (Eclesiastes 2:14).

  1. O Risco de um Olhar pessimista

            “Algumas das mulheres entre nós nos deram um susto hoje. Foram de manhã bem cedo ao sepulcro e não acharam o corpo dele. Voltaram e nos contaram ter tido uma visão de anjos, que disseram que ele está vivo. Alguns dos nossos companheiros foram ao sepulcro e encontraram tudo exatamente como as mulheres tinham dito, mas não o viram”. Lucas 24: 22-24

                As opções para as quais os discípulos podiam lançar seus olhos eram múltiplas. Nos últimos dias muitas coisas tinham acontecido. Jesus havia sido preso, julgado e morto; Ele, após ter ressuscitado, aparecera às mulheres; elas contaram o que viram aos outros discípulos; eles foram ao sepulcro para conferir o que as mulheres disseram... Tudo isso foi narrado pelos dois discípulos naquele caminho longo que percorriam retornando ao que eram antes de se encontrarem com Jesus. Outros olhos, além dos seus próprios, já tinham visto aquilo que podia evitar tanto sofrimento e desespero. Por que eles escolheram fixar seus olhos sobre os aspectos negativos e não sobre os positivos? Essa pergunta também se aplica a nós: Por que nossos olhos tendem a pousar sobre os aspectos negativos da vida, quando teríamos tantos outros positivos para os quais olhar e que outras pessoas ao nosso lado veem tão bem?

            O que parece é que aquilo que os outros veem não serve para nos convencer existencialmente. É necessário que nós mesmos tenhamos uma experiência a fim de que nossos olhos se voltem para aquilo que poderia ser tão obvio para o outro, mas não para nós. Isso foi o que aconteceu com aqueles dois discípulos de Emaús. O sentimento experimentado por esses discípulos é muito próximo ao de Tomé, que precisou ver na sua frente o Senhor Jesus, para que então pudesse crer no que havia acontecido.

            A todo o momento nós teremos as duas opções na nossa frente: O pessimismo e o otimismo. Num sentido Cristão, a Fé e a desesperança. Alimentar a Fé significa depositar nossa esperança em algo maior que nós, capaz de transformar e operar de forma que foge dos padrões humanos. A Fé nos torna capaz de olhar além das circunstancias. É como se nosso olhar ganhasse outra dimensão. Mas precisamos reconhecer que somos limitados, tanto quanto os discípulos, que por estarem com o coração cheio de desesperança, não conseguiram enxergar Aquele que caminhava com eles.

  1. O pão, a palavra e os olhos abertos.

            Então, ele entrou para ficar com eles. Quando estava a mesa com eles, tomou o pão, deu graças, partiu-o e deu a eles. Então os olhos deles foram abertos e o reconheceram, e ele desapareceu da vista deles. Perguntaram-se um ao outro: “Não estava queimando nosso coração, enquanto ele nos falava no caminho e nos expunha as Escrituras?”.

            Há circunstancias providenciadas pela vida que nos fazem ver com  mais nitidez aquilo que antes não víamos, senão de forma obscurecida. À mesa com Jesus, os discípulos tiveram os olhos abertos. O pão partido por aquelas mãos tão conhecidas, as graças dadas por aquela voz tantas vezes ouvida, com palavras de tanto amor e esperança, fizeram as escamas que cegavam aqueles homens caírem, abrindo seus olhos para uma nova vida, com novas cores e sabores. O partir do pão que fez com que os discípulos reconhecessem o Mestre vivo e, com ele, vivas todas as esperanças. Não era algo simples; antes significava o reencontro com aquele que havia partilhado com ele toda a vida, inclusive nos limites da própria morte. O pão partido permitiu-lhes recordar de muitas experiências vividas com Jesus. “Os olhos deles foram abertos”. Após terem os olhos abertos, “Jesus desapareceu da vista deles”. Parece uma contradição: antes, eles tinham Jesus diante dos olhos e não o reconheciam; agora, com os olhos abertos, não era mais necessária a presença sensível do Mestre.

            Junto com o partir do pão, o outro elemento que abriu os olhos daqueles homens foi a palavra de Jesus. É a palavra do mestre que pode proporcionar a experiência da vida plena capaz de levar os olhos dos homens e mulheres da desesperança a esperança, da morte a vida, das lembranças negativas às positivas. Como disse Pedro em outro episódio: “Senhor, para quem iremos? Tu tens as palavras de vida eterna”. (João 6:68).

Conclusão:

            Na primeira parte de nossa mensagem, aprendemos que olhar para Jesus de longe faz com que estejamos perdidos a ponto de negá-lo, como aconteceu com Pedro. O olhar de longe é o olhar da insegurança, das dúvidas e do medo. Quando isso acontece conosco, nossos olhos nos entregam e revelam que estamos querendo ser aquilo que não somos. Nesse momento, é preciso procurar o brilho dos nossos olhos que só é possível em Jesus. Aprendemos também que o olhar do Mestre para nós sempre será um olhar de amor e compaixão. Um olhar que faz com que nossa identidade seja revelada, um olhar que nos reconcilia com Ele.

            Na segunda parte, percebemos que quando deixamos nossa mente focada nos sofrimentos e na desesperança, nossos olhos vão enxergar apenas os problemas da vida, nos cegando e nos impossibilitando de enxergarmos a esperança. Enquanto os discípulos de Emaús estavam caminhando com o Mestre, não o reconheceram porque seus olhos estavam focados na desesperança. No entanto, quando seus olhos foram abertos, eles encontraram a esperança que precisavam.

            Que nossa visão esteja sensível ao Mestre. Mesmo que as circunstancias da vida tente nos impedir de enxergá-lo, que nunca percamos o Mestre de vista e que nunca venhamos segui-lo de longe. Que possamos ter experiências profundas com o Senhor através deste maravilhoso sentido.

 

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