O que me faz prosseguir em conhecer

O EVANGELHO DAS CHAGAS ABERTAS, E O EVANGELHO DAS PORTAS ABERTAS

14/06/2016 22:45

Atos 16:16-34

Só existe um Evangelho, no sentido de anúncio de salvação por meio de um único mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo.

É o que as Escrituras afirmam, de maneira inegociável e todo cristão genuíno deve crer assim.

Mas quando me refiro a dois cristianismos, estou querendo dizer, na verdade, que este único Evangelho pode ser vivido e enfatizado de duas maneiras diferentes.

Pelo menos é  assim que tem acontecido ao longo da história, e até os nossos dias, em diferentes lugares do mundo, pelo que me consta.

De fato, isto é nítido em nossa geração diante de tudo o que temos visto.

O primeiro tipo de cristianismo revelado na experiência de aprisionamento dos apóstolos em Filipos poderia ser chamado de O Evangelho das chagas abertas.

Assim que foram presos em Filipos, Paulo e Silas tiveram seus corpos violentamente açoitados com varas que...

Este é o cristianismo da dor, do sofrimento, da renúncia, do martírio, fruto de seus posicionamentos em viverem o Evangelho e promoverem libertação em nome de Jesus. No caso aqui, da mulher que tinha um espírito de adivinhação e, por isso, indo contra um sistema religioso vigente no local.

Em vários lugares do mundo, ao longo da história, homens e mulheres fiéis a Cristo viveram e pregaram o Evangelho na perspectiva do sofrimento intenso.

Não é que amavam o sofrimento, mas amavam ao Deus que lhes concedia a honra de sofrer ou de até morrer pelo seu nome.

Até hoje, em várias partes do mundo, este é o cristianismo que muitos cristãos conhecem, na medida em que sacrificam o conforto, a liberdade, os bens, o status e até a vida, por amor a Jesus.

Muitos cristãos, especialmente no ocidente livre, não tem a menor ideia de que este Evangelho das chagas abertas é vivenciado no nosso mundo ainda hoje, por irmãos e irmãs de diferentes denominações cristãs.

Gente rara, com os corpos cobertos de chagas, visíveis ou não. Gente que não se escandaliza com o sofrimento por amor a Cristo, mas que, na verdade, se sente privilegiada por ele.

Observamos, por exemplo, nas atitudes de irmãos nossos que não negam a Jesus e pagam com a vida por isso, nas atrocidades cometidas pelo EI.

O segundo cristianismo que emerge da experiência da prisão dos apóstolos em Filipos é o que pode ser chamado de O Evangelho das portas abertas.

Paulo e Silas experimentaram isso ao verem as portas da prisão de Filipos se abrirem como consequência do terremoto particular que Deus enviou do céu, em resposta sobrenatural de Deus ao louvor e à fé do seu povo.

Este é o cristianismo do atendimento às orações, ou seja, das portas abertas.

Contudo, em nosso contexto de ocidente, de país livre, é interpretado como cristianismo das curas, dos problemas solucionados, das conquistas de fé, dos testemunhos de bênçãos recebidas, mas que, infelizmente, é mal interpretado, mal pregado e ensinado, pois não deixa espaço, não faz referência e nem mesmo aceita o outro cristianismo.

Então, estas duas ênfases da fé cristã – chagas abertas e portas abertas – têm caracterizado a saga da igreja na Terra, desde o seu princípio até os dias de hoje.

A igreja perseguida é a mais fiel representante do Evangelho das chagas abertas, enquanto a igreja livre é a mais fiel adepta e propagadora do Evangelho das portas abertas.

Estas duas ênfases são, na verdade, as duas faces de uma mesma moeda, por assim dizer.

Às vezes Deus responde às nossas orações e envia o livramento do céu – como um terremoto do seu favor.

Às vezes Deus permite que os homens ou as circunstancias nos agridam e nos rasguem as costas, ou a reputação, ou a segurança, ou os bens, etc...

Infelizmente, por não compreenderem esta verdade, há alguns que se confundem ou até se escandalizam diante das chagas abertas da experiência cristã.

Não compreendem que às vezes as costas são rasgadas, às vezes as portas são abertas.

Porém é  o mesmo e único Evangelho, bem conhecido por Jesus – que foi adorado como rei, mas também vendido a preço de escravo – que foi aclamado com cânticos de hosana, e também condenado com brados de crucifica-o, que conheceu o sofrimento e a glória, a cruz e a ressurreição.

É o mesmo e único Evangelho dos apóstolos, que ressuscitaram mortos, mas que também foram assassinados; que dormiram em abismos gélidos por amor a Deus, mas que foram também arrebatados até a ambiência aconchegante do céu.

Só que, por conta disso, dessa dupla característica, vivemos um problema que precisa ser compreendido, solucionado.

Trata-se de equilíbrio.

A única maneira de equilibrar estas duas ênfases da fé, de maneira saudável e frutífera, sem pender nem para um penitencialismo extremado nem para um triunfalismo exacerbado é assumir o que chamo de atitude de bocas abertas.

Como vemos nas Escrituras, depois de serem açoitados, e antes que as portas da prisão de Filipos fossem abertas miraculosamente, Paulo e Silas abriram suas bocas para exaltar a Deus com cânticos de louvor.

Suas costas estavam rasgadas pelas varas do carrasco, mas suas bocas também se abriram para dar glórias a Deus.

Os  sofrimentos que passamos, as lutas – muitas cruéis – e que nos deixam até meio que sem entender o porquê, meio que sem esperança, não podem sabotar nossa fé.

Este é o ponto de equilíbrio e de sabedoria na experiência cristã.

Para os apóstolos, as chagas abertas em suas costas não os impediam de dar glórias a Deus. As chagas abertas não sabotavam sua fé.

Do mesmo modo, quando as portas se abriram, os apóstolos não se apressaram em sair da cela.

Sabem por que? Porque as portas abertas não definiam a sua fé.

Receber uma benção, ter um problema solucionado, vencer uma luta, não é o que define nossa fé.

Na verdade, de acordo com o relato bíblico, o carcereiro se surpreendeu ao perceber que todos os presos – inclusive os apóstolos - permaneciam no interior da prisão, mesmo depois do terremoto divino haver escancarado todas as suas portas.

Ora, o que é que um prisioneiro mais deseja ver na vida, senão as portas da sua prisão totalmente escancaradas bem a sua frente, não é mesmo?

No entanto, Paulo e Silas estavam ocupados demais em dar glórias a Deus para permitirem que as circunstâncias da vida – boas ou ruins, de chagas abertas ou de portas abertas, de sofrimento ou de livramento, de fartura ou de escassez, de perda ou de conquista, de saúde ou de doença, de alegria ou de tristeza – sabotassem ou definissem o relacionamento deles com Jesus.

Isso inclusive é um outro contexto que o próprio Jesus disse à multidão que o seguia , a respeito de si mesmo, em João 6.

Enfim, quem se ocupa em glorificar a Deus, antes de tudo – com os lábios e com a vida – está pronto para viver o evangelho de chagas abertas e dar glórias a Deus no sofrimento; ou viver o evangelho de portas abertas e dar glórias a Deus no livramento.

Esta postura de preferência inegociável pela glória de Deus é a única explicação plausível para a imbatível resiliência da igreja perseguida ao longo da história.

Ao mesmo tempo, penso que este entendimento pode ser uma salvaguarda teológica para proteger a igreja livre de uma tendência cada vez mais acentuada de se autodefinir pelas suas conquistas, pelas suas posses, pela quantidade de seus membros, pelo seu poder político ou financeiro, pelos seus recursos acumulados, ou pela fama e status dos seus integrantes.

Uma vez que eles amavam mais a glória de Deus do que as circunstâncias desta vida, Paulo e Silas se tornaram, de fato, homens livres.

Tão livres que depois de comerem na casa do carcereiro convertido e de batizarem a ele e aos seus familiares, Paulo e Silas voltaram para a mesma prisão, para passar a noite naquela cela de portas destrancadas pela mão de Deus.

Eram livres dentro da cela. Eram livres fora dela.

Eram livres para sair da prisão. Eram livres para retonar à prisão.

Eram livres para suportar, fazer, ou passar por qualquer coisa, conquanto vissem realizadas as intenções de Deus, de revelar o seu amor aos habitantes perdidos de Filipos, a começar pelo carcereiro e sua famíla.

Eram livres na preferência pela vontade de Deus, de tal modo que não lhes fazia a menor diferença ver as portas abertas diante de si ou as chagas abertas nos seus próprios corpos.

Para os apóstolos, tanto o sofrimento quanto livramento eram apenas duas faces da mesma experiência fascinante de seguir a Jesus de verdade.

Para concluir:

Sobre Paulo e Silas, o que lhes importava, de fato, é o mesmo que nos deve importar também:

É vivermos a santa obsessão de vermos realizadas as intenções de Deus na Terra – seja por chagas abertas, seja por portas abertas, mas sempre com as nossas bocas abertas para glorificar a Deus,

Por tudo, em quaisquer circunstâncias. 

E assim, darmos ecos à Palavra de Filipenses 4:13, e vivermos a sua integralidade: de que venha o que vier, “tudo podemos naquele que nos fortalece”.   

 

 

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